sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Como é o projeto de um automóvel?

Eu nunca havia encontrado o projeto de um automóvel. Não me refiro a vistas explodidas, cutaways ou esquemas dos manuais de serviço. Mas desenho mesmo, projeto de engenharia, nanquim sobre poliéster, como se fazia antigamente.

É compreensível que isso não exista dando sopa por aí. Além da propriedade intelectual, do sigilo absoluto sobre as técnicas de construção, me ocorrem também questões de segurança que poderiam ser exploradas por pessoas de má índole. Estas sim, existem aos montes por aí.

Na semana passada, surfando por aí, achei um conjunto completo de desenhos do Continental Mark III de 1958. São 31 páginas, formato 12″x24″, com os detalhes de construção de um Lincoln com wheelbase de 132″ e portas suicidas. O detalhamento é completo, em que pese este carro nunca ter sido construído. Sim, my friend, este Continental ’58 Mark III nunca saiu do papel.

Aprendi que este Mk III na verdade era um Mk II com a frente e a traseira redesenhada, com o entre-eixos maior e mais portas. Curioso é que este automóvel em questão era da divisão Continental. Não confundir com o Lincoln Mark III de 1958 que é outro automóvel. No mesmo ano a Continental e a Lincoln se fundem em uma única divisão, mas mesmo assim não houve um Continental Mark III neste ano.
Conforme desenhos a seguir se pode ver a diferença entre ele e seu predecessor. As partes que seriam apenas dele estão em vermelho.

Este material inédito caiu no colo do engenheiro Barry Wolk, pelo que li um veterano coleccionador e entusiasta dos Lincoln, que digitalizou tudo e publicou na internet.
Ele merece um prêmio por isso. Veja o tesouro.

Fiquei lendo os comentários dele e seus colegas, em sua maioria profissionais familiarizados com as modernas ferramentas de desenho CAD, 3D e afins, e em uníssono eles reconhecem a habilidade – perdida há mais de uma geração – de se projetar complexos cortes e vistas como estes sem o auxílio do computador. Como se diz, no braço mesmo. Com réguas, curva francesa, esquadros, compasso…
Só para ilustrar a comparação, eis os principais modelos Lincoln para 1956, 57, 58 e 59.

Como nossa época é melancólica. Quando penso que tal habilidade se perdeu, me pergunto o que teremos a oferecer às próximas gerações em termos de arte, sensibilidade e talento. Como eles dizem em determinada parte da conversa, é comum hoje em dia o profissional que cria em 3D sofisticados modelos gráficos de produtos e máquinas, mas é absolutamente incapaz de convertê-lo para duas dimensões e assim instruir sua montagem e produção. E nos achamos modernos. Uma ova.
Todas os 31 desenhos do caderno estão aqui neste link.
No fórum onde descobri estes desenhos, estranhamento dedicado aos VW, só para ter idéia de como são preciosos esse tipo de documento, um membro afirma que os arquivos pessoais de Edsel Ford, pai do Lincoln by Ford, foram destruídos sem motivo aparente por seu filho, Henry Ford II, nos anos 70. Diabos, por que isso sempre acontece?
De qualquer forma, este deve ser dos poucos que sobraram e torço para conhecer outros exemplos da engenharia automotiva. Quem sabe, blueprints do Mustang, Ford 49, Ford T, A e B, Camaro (o primeiro automóvel a utilizar o computador em seu projeto, se não me engano) e tantos outros que sempre sonhei em ver assim, dissecados, pois sou fascinado por esse tipo de coisa, digo, arte.
O assunto não para por aí. Estou aqui repetindo o que li, pois se de carro não entendo muito menos sobre os Lincoln. Alguém achou uma sucata do que parece ter sido um protótipo deste Mark III. Não com 4 portas, mas sem dúvida um Continental que com a frente e traseira deste que deveria ter sido apenas um desenho. Pelo visto, alguém na Ford decidiu construir pelo menos um. Incrível este carro estar abandonado deste jeito. Será que nem os americanos entenderam do que se trata?

Aparentemente, o assunto ainda têm muito para ser investigado ainda. Como esta foto de um Continental com a frente igual a do desenho. Troço complicado isso. Estou escrevendo sobre o que não entendo, mas que é tudo muito esquisito, é.

Sobre os Lincoln, escreveu um cidadão no mesmo post de onde vieram os desenhos acima, a frase a seguir, que me fascinou pela síntese mas também por dar um amplo e ilustrado panorama do que para ele representam os Lincoln para a história do automóvel:
Few carmakers have had such a multi-faceted product line over the years as Lincoln, IMO. Stately, ultra-conservative cars for the elite in the beginning, innovative, medium-priced future-mobiles with the Zephyr later on, along with classically designed big Lincolns during the Edsel years, then after the war come the modern, sleek-if-bulky Cosmos, leading to the motorsports-championship-winning “road-race” Lincolns of the early 1950s, then venturing back to the elite-trade with the Continental Mark II, and going bulgemobile-haywire with the late-fifties big Lincolns, then finding sanity and grace with the Engel Continentals of the sixties, and so on, this carmaker has really gone through “changes” that make its story very interesting and even compelling. I hope you keep on posting Lincoln topics here, and draw-in more new enthusiasts as you do so. It’s a great name that deserves to be in the spotlight.
Para arrematar, no mesmo post descobri que o Barry enviou as blueprints do Lincoln Mark II e III para um suíço de nome Roger Zimmerman, que constrói, em puro metal, réplicas hiper-realistas de automóveis em escala 1:12. Em toda sua vida ele já fez a impressionante quantidade de 2 réplicas, apenas. Também pudera. Ele demora 10 anos para construir cada uma. Ele já têm 65 anos e quando tiver 75 a réplica do Lincoln deve estar pronta. Não é fascinante como os europeus conseguem planejar esse tipo de coisa? Duvido um carioca se programar para daqui 15 dias.
Veja algumas fotos do trabalho dele. A seguir, torneando as rodas.

Ah sim, ele só usa metal e borracha para os pneus. Mais nada.

Quando ele fica puto com a patroa, só pode ser, acho que ele decide fazer as rodas de bronze também, só para acalmar. Dá para acreditar nas fotos abaixo?

Depois de Deus, só um sujeito com uma habilidade destas é capaz de me fazer sentir tão insignificante.
Saca o motor do limpador do pára-brisa que ele fez para o próximo modelo dele…

Ele descrevendo como teve que resolver a questão das tampas do cabeçote é algo irritantemente sensacional. Como pode uma pessoa tão comprometida e dedicada assim?
Primeiro, o cabeçote original.

E agora a micro tampa do doido.

Ele têm cara de gênio ou louco? Ambos??

Ah, os outros dois modelos que ele construiu nos 20 anos anteriores foram esse Avanti e o Toronado. Carro de doido, como se vê.

O Robert está postando o desenvolvimento de seu trabalho aqui neste link. Vá acompanhando com paciência. Daqui 10 anos ele termina.

Fonte: carrosantigos.wordpress

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